Domingo de Carnaval

THAÍS VELLOSO

Passaram a sexta e o sábado de Carnaval. Acorda tarde, pisa no glitter espalhado pelo chão da casa, separa a camisa da escola pra vestir à noite, coloca a playlist com os sambas-enredo das agremiações do dia, pensa no desfile que mais quer ver, prepara a bolsa térmica, separa o cartão do metrô e os ingressos e, quando se dá conta, já é hora de sair de casa novamente.

A caminho da Sapucaí, comenta com amigas e amigos as expectativas pro primeiro dia do Especial e as impressões sobre os desfiles do Acesso; sente o coração embriagado pela sensação de estar, ao mesmo tempo, em um dia que marca o início das apresentações e a metade de todas elas; canta o samba da própria escola, pedindo, como se fosse reza, que ela venha da melhor maneira; lembra os ensaios de rua e sorri, confiante no grito que chama a vitória.

Chegando ao Centro, pensa nos domingos de bloco, que contam com outra dinâmica: acordar bem cedo. Por ali, a rua se enche de pessoas que decidem não falar de tristeza e então desfilam com seus estandartes, revelam as fantasias compradas ou confeccionadas dias antes e espalham confetes, espumas, serpentinas. Nas proximidades do Sambódromo, componentes e torcedores com ingressos pendurados no pescoço carregam fantasias, instrumentos, cervejas, salgadinhos, espetinhos, cachorro-quente, refrigerante, água e capa de chuva. Com a certeza de que um lindo dia se anuncia, presenciam, enfim, o terceiro dia de Sambódromo, o primeiro de desfile do Grupo Especial.

No ano em que nasci, minha escola, a Vila Isabel, desfilou no domingo. Em 2006, foi campeã após ter passado pela Avenida no domingo. E foi também se apresentando no domingo que a Vila poderia ter conquistado mais um título, em 2012. O domingo de Carnaval, portanto, é um dia peculiar, ainda mais se considerarmos que, diferentemente da segunda-feira, tem mais chances de ser surpreendente. Isso porque, sabemos, pouquíssimas foram as vezes em que uma escola de domingo levantou a taça, fator que faz com que muitos comemorem quando sua escola é sorteada pra segunda.

Enquanto seleciono essas memórias dos domingos de carnaval, penso no Sambódromo vazio. Hoje seria dia de não notar o corpo cansado da sexta e do sábado na arquibancada e voltar mais uma vez pro melhor lugar da cidade: “Atenção, Sapucaí!”. É esse o instante da tensão desmedida, da alegria eufórica, da curiosidade, da concentração. O esquenta da bateria, a primeira escola pronta pra entrar, as alegorias encaminhadas, as bandeiras tremulando no setor 1…

Apesar de ter noção de que “nada se acaba quando é feito por paixão”, como afirma a letra de “Vitória da Ilusão”, é impossível não estar saudosista e comovida em um Carnaval que nem pôde começar, por todos os motivos que isso envolve. Este fevereiro esquisito, em que o domingo de Carnaval não tem o mesmo significado que comumente tem para nós, é tempo de nos atentarmos a mais um verso de Adir Blanc: “Das cinzas à ressurreição!”. Afinal, num dia que se assemelha a uma quarta de cinzas sem apuração, é preciso abrir alas para a esperança.

Com grandes enredos na cabeça e prontos para renascer das cinzas, plantaremos de novo o arvoredo quando enfim chegar o Carnaval. Enquanto a gente sofre com a espera, o controle remoto aponta pra televisão e seleciona os desfiles antigos que fazem a gente cantar e vibrar na sala de casa. Tão bonita, a nossa escola…

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